A mais estilizada das pontes romanas do nosso concelho - a da Folgosa do Salvador - está votada ao abandono há décadas.
Uma belíssima ponte, sem guardas - o que é raríssimo ou mesmo inédito em pontes romanas - tem 3 arcos, 2 deles principais e um terceiro de escape em caso de cheias, o que indicia que o rio Seia, à época (há mais de 2000 anos), seria bem mais caudaloso do que é hoje.
Ao contrário de muitas outras erradamente classificadas como pontes romanas, esta é seguramente uma ponte romana genuína, o que pode ser atestado pelo magnífico marco miliário que está instalado na sua saída sul.
Um marco que indicia que a ponte e a via terão sido construídas, o mais tardar, no tempo de Augusto ou Adriano.
Pessoalmente estou convencidos que o terá sido ainda antes, no tempo de Júlio César.
Explico porquê no final do texto.
As inscrições dos marcos miliários são uma fonte crucial para entender o sistema viário romano ao indicar o ponto de partida e as respectivas milhas percorridas ou, por vezes referindo os trabalhos de reparação efectuados na via.
Infelizmente muitos dos caracteres deste marco estão já imperceptíveis, pelo menos para os olhos de um não especialista. De qualquer modo, a sua existência ali atesta que a ponte e a via que a serve são genuinamente romanas.
Há meia dúzia de anos os automóveis ainda podiam chegar à ponte. Hoje já não. Neste momento nenhum automóvel consegue chegar perto, sequer, porque os acessos foram destruídos pelas chuvas dos sucessivos invernos sem que tenha havido qualquer tipo de manutenção do piso térreo.
A própria ponte está tomada pelo mato.
Do lado juzante já nem sequer se consegue ver. Apenas do lado a montante ainda se consegue descortinar a sua silhueta, mesmo assim oculta pela vegetação.
Esta é uma ponte magnífica que, em conjunto com o marco miliar referido, constitui um património histórico e cultural ímpar no nosso concelho e região. Mas que se encontra completamente abandonado.
Tão mau como isso é o atentado ambiental em curso.
Os juncos ao longo do rio estão a ser cortados para lenha, como as fotos evidenciam. Por aí não vem mal ao mundo e seria até de agradecer que deixassem a imagem da ponte limpa de poluição visual.
Simplesmente muitos deles, ao serem serrados, caem para o leito do rio. E ali são deixados.
Neste momento há centenas de troncos e ramos caídos sobre o rio, de forma que o conseguem ocultar quase completamente.
Estes troncos, para além de ocultarem e ocuparem quase totalmente o leito do rio, destruindo o interesse turístico que ele possuía, como se pode ver nas fotos de 2004, constituem uma rede emaranhada que impede o normal desenvolvimento da fauna piscícola, ainda mais tratando-se de um caudal tão reduzido como aquele.
Urge, portanto, que as entidades competentes procedam à limpeza da ponte e do rio, melhorem os seus acessos e cataloguem este importante monumento concelhio que poderá ter mais de 2000 anos.
Recorde-se que Júlio César acabou com a resistência dos lusitanos no ano 60 a.C e que Viriato foi assassinado ainda antes, por volta do ano 150 a.C.
Esta ponte, que deve ter sido construída como elemento de apoio logístico à invasão e instalação do Império Romano na nossa região pode, portanto, ser mais antiga que Jesus Cristo e, se se confirmar ter sido construída no final da resistência lusitana, curiosamente deverá ser contemporânea à remodelação do Circo Máximo de Roma (50a.C).