4.20.2002

Herman e o povão

(publicado no Expresso Online - leitor com opinião)

Herman José, o mais inteligente humorista português de todos os tempos, músico e designer nato e dialogador robusto e acutilante, possuidor de um background cultural invulgar na TV portuguesa dos nossos dias, vê-se agora inesperadamente abafado pela majestosa estupidez dos bate-chapas "muito-homens" e das modistas "com-cancro-da-mama", inusitados intevenientes e protagonistas nesta nova inqualificável saga da Sic.

Uma virtude tem este "pugrama" - revelar ao povão tele-espectador a sua verdadeira essência.

Antigamente amáveis, hospitaleiros, humildes e honestos - adjectivos que durante décadas o Estado Novo tentou instituir como Qualidades dos Portugueses, - revelam-se agora diária e finalmente as verdadeiras pedras basilares do âmago popular, sendo a principal e mais evidente a do analfabetismo congénito, que naturalmente traz a reboque a estupidez convicta, a inveja metódica, a idiotice conformada e a mediocridade anacrónica como "forma de estar", a par do subdesenvolvimento atroz como filosofia de vida.

Eis o povão segundo Herman José, no seio do qual ele decidiu agora inserir-se, para experimentar novas sensações em directo (sic).

Mas um duelo em directo com armas desiguais não é leal.
Superiormente dotado, Herman está visivelmente diminuído neste embate.

É que tal como não se pode ensinar um porco a falar francês, também não é possível transmitir qualquer tipo de informação ético-cultural àquela gente, simplesmente porque ela não possui os códigos e estruturas mentais necessárias à interiorização de qualquer conceito que não seja o da satisfação imediata das suas necessidades fundamentais.

Herman devia saber isso há muito, mas pelos vistos, não.

E assim, pela primeira vez desde 76, é possivel ver Herman claudicar, chegando ao ponto de desisitir sequer de intervir, completamente sufocado naquele estúdio da Endemol, onde não há um único ser vivente que lhe reconheça a ascendência que a sociedade cultural, em que se habituou a movimentar, sempre lhe conferiu.

Herman José é, no Masterplan, um génio fragilizado e esmagado pelo povão.

O mesmo povão que, por opção própria, se constitui e revê numa exponencial e esmagadora avalanche de idiotice e incultura, que consolidadamente vem relegando o nosso país para o seu justo lugar no ranking das nações da Europa.

João Tilly
20/04/2002

joao.tilly@netvisao.pt