6.28.2004

Durão coloca Sampaio entre a espada e a parede

A saída para a situação política criada pela presumível aceitação do cargo oferecido a Durão constitui apenas o maior drama da vida de Sampaio.
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Se este fosse um país normal a coisa até seria de fácil resolução: o governo cai e o Presidente da República aceitaria a proposta de um novo primeiro-ministro proposto pela coligação.
Depois, aceitaria o elenco e dar-lhe-ia posse.
Isto tudo poderia fazer-se em 15 dias.
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Mas este não é um país normal – continua no final da tabela em todos os rácios positivos (ensino, investigação, saúde, justiça e qualidade de vida) e na cabeça dos mais negativos (droga, sida, analfabetismo, improdutividade, acidentes rodoviários e laborais, esperança de vida) - e, portanto, tudo se complica.
Primeiro porque o povo não sabe em quem vota. Pensa que vota num partido e num primeiro ministro. Até Sampaio já percebeu isso.
Portanto, ou o PR não liga nenhuma ao real sentir do povo e cumpre a lei, o que lhe trará a imediata excomunhão da sua “família” política ou verga-se perante a tugalidade reinante, dissolve o Parlamento e suicida um futuro lugar de alguma importância na História.
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O que deve Sampaio fazer?
O que o Presidente da República deve fazer é, obviamente, cumprir a lei, bem sabendo que o povo não a conhece.
Mas a Lei é Lei, mesmo num país que valoriza o futebol acima de todas as coisas. Sampaio tem que aceitar a nomeação de Santana e chancelar o seu governo.
A esquerda vai berrar com quanta força tem porque bem sabe que o populismo de Santana é uma coisa fora do catálogo.
E que um governo liderado por ele remeterá em pouco tempo a "esquerda" clientelista para as calendas gregas; os comunistas para um lugar ainda mais macarrónico, e o Bloco de Esquerda e o PP para as suas verdadeiras e minúsculas clientelas.
Mas se Sampaio ceder à evidência - a de que o povo vota, de facto, numa figura - terá que dissolver imediatamente o Parlamento e convocar eleições antecipadas, cometendo um erro histórico de consequências perfeitamente previsíveis até para si próprio: uma reforma sem reconhecimento internacional e um lugar na Administração da Fundação Mário Soares.
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E quanto a Durão?
Aproveita a oportunidade única de repetir o que Guterres já tinha feito: abandonar o barco enquanto é tempo.
É que, depois do verão, serão mais que muitas as empresas que não abrirão as suas portas e teremos mais umas dezenas de milhares os desempregados às costas no final da estação sazonal. E aí ninguém, a não ser a Ferreira Leite, continuará a acreditar minimamente nas soluções implementadas pelo seu governo.
Pensará ele, neste momento: «quem cá ficar que se aguente!».
E completo eu: o último a sair feche a porta.
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A sorte de Santana
Por seu lado Santana não dorme, há anos, a sonhar com esta oportunidade.
Abraçá-la-á com todas as suas forças porque não terá outra.
E pensa que pode fazer bem.
E se calhar até pode. Ele não tem medo dos barões do norte nem do lobby da coligação de Lisboa.
Gosta de futebol e até foi comentador nas televisões, mas sabe medir até que ponto as doses industriais de bola ministradas ao povo mais inculto da Europa se pagam, historicamente.
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Inevitabilidade:
Sampaio não terá outro remédio senão negar o jeito aos seus compadres e nomear Santana.
E, daqui a dois anos, voltaremos ciclicamente ao mesmo: ou a sua popularidade vence e ele consegue começar a transformar isto nalguma coisa que se respeite por essa Europa fora, ou arranja um pretexto para mudar de vida, tal como Guterres e Durão.

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