2.05.2004

A mediocridade leva a melhor nas escolas... mas não nas marisqueiras.



Um texto de um (bom) aluno da minha escola chamou-me hoje a atenção, por estar exposto na sala de aula e estar formalmente bem escrito, o que nem sempre acontece.
Contava a história de um caranguejo que tinha, desde sempre, um sonho: o de andar para a frente, ao invés de todos os seus iguais que, como se sabe, não têm essa inclinação.
Uma coisa tipo Fernão Capelo Gaivota, mas penso que original - não acredito que o mocinho alguma vez tenha visto esse filme.
E daí não sei, porque eu projectei-o há 2 anos no clube de cinema da escola, entretanto extinto.
De qualquer forma a ideia é gira.
O problema foi o final.
O caranguejo apaixonou-se e a caranguejinha pôs-lhe o dêdo no nariz: ou ele se punha fino e abandonava a ideia, ou tinha que arranjar outra carapaça-gémea.
Bem: o noivo pensou, pensou, e chegou à conclusão que era melhor abandonar o sonho e passar a andar como os demais.

Raramente tenho lido conclusões tão deprimentes como esta.
O mais espantoso é que se trata de um miúdo dos seus 13 anos (7º ano) e dos melhores do seu ano.
Quer dizer: os miúdos - mesmo os mais inteligentes - já vêm imiscuídos do virus da mediocridade quer de casa, quer da escola, e provavelmente dos dois.
Criatividade? Ambição? - Nunca!
«Sê como os demais, bruto e atrasado se preciso for (e neste caso, acreditem que é mesmo), sem horizontes maiores que a janela da cozinha, que é assim mesmo que se deve ser... para não destoar».
Einstein, felizmente, não foi nessa.
Nenhum criador, cientista, descobridor vai nessa.

Que pena... uma escola oficial promover (incentivando e expondo) este tipo de mediocridade filosófica - exactamente o contrário das novas correntes pedagógicas que justamente apelam à criatividade, à diferença, à protecção do universo distinto e sagrado que cada aluno encerra e que é preciso respeitar e incentivar em todas as suas vertentes lúdicas e sociais.
Que pena...
E depois estranha-se que os colégios particulares milionários sejam os que apresentam melhor rendimento no final do ano.
Algum ministro tem algum filho numa escola oficial?
Vai lá vai...

Voltando ao conformado caranguejo, agora perfeitamente inserido no seu meio social: a história não o diz, mas presume-se que a sua vida tenha sido longa e muito feliz na companhia da carangueja naquele belíssimo aquário, e que tenha recebido a justa homenagem do cozinheiro da marisqueira antes de, como lhe compete e dele é esperado, ter servido de refeição a um qualquer dirigente desportivo da 2ª distrital.

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