12.04.2003

Mas para que é que se metem em trabalhos?


É notória a incapacidade de análise e digo mesmo o irreconhecimento do país, por parte de alguns membros do aparelho de estado que, volta meia volta, se lembram de começar a brincar aos Estados de Direito a sério, num condado de mera brincadeira, como o nosso Portugágál.
Então cabe na cabeça de alguém instaurar processos à própria GNR?
Isso é como colocar um muro de cartão para conter a maré, ou tapar o sol com uma rede.
Os próprios agentes disseram às televisões, quando rebentou o escândalo, no ano passado, que: " se vão prender todos os agentes que metem gasolina nos estaleiros dos construtores, então não fica cá nenhum fora...!"
O mais lindo deste país é isto. É suposto e aceitável que a BT meta gasolina nos estaleiros de uns, vá almoçar aos restaurantes dos outros, compre mercearia nos supermercados dos terceiros, roupas e automóveis nas lojas e stands dos quartos e dos quintos... dos infernos. É assim mesmo que isto funciona há décadas, ou ainda havia algum cromo que não soubesse?
Quantos casos queremos de meros agentes com ordenados modestos, que descontraídamente ostentam fortunas pessoais escandalosas?
Quem anda na estrada e acaba por ter que almoçar nos mesmos sítios que eles, sabe bem que nenhum agente paga qualquer despesa nos restaurantes onde almoça: e mais sabe que os agentes se tratam e regam bem, nos intervalos das sessões diárias de multas por excesso de álcool na IP5, por exemplo. A coisa não se faz nunca por menos de 1 garrafinha do tintol e um whiskyzinho por agente para a sossega, enquanto os camionistas olham para eles e se contêm com um copito ou 2, não vão eles "marcá-los"... E alguém lhes pergunta se eles querem soprar no balão antes de nós, para se aferir da calibragem do aparelho???
Para que é que mexem no vespeiro?
Mas alguém se lembra, em Itália, de denunciar a Camorra? Ou há algum maluco, no Rio, que se lembre de começar a fiscalizar as vivendas da Rocinha?
Perguntem à EDP quantas barracas abastece 1 baixada nas favelas... e logo percebem porque lhe chamam "um investimento de alto risco económico".
Só mesmo numa anedota de um paí­s destes é que poderiam existir palermosos - chonés - que se lembrem de se ir mexer com a portugalidade profunda no sistema.
Depois dá nisto:
Greves às multas na IP5, porque eles são os donos das estradas, perseguições a carros da PJ em plena auto-estrada, em retaliação às detenções dos GNRs, confissões generalizadas e muito naturais dos crimes de corrupção e aproveitamento praticados usualmente, porque de facto se trata da coisa mais natural do 3º mundo.
E depois ainda podem apanhar com um advogado alucinado que ponha a boca no trombone, antes que alguém se lembre de se chegar ao pé dele a meter-lhe medo... e esclareça o povo de que são os próprios comandos quem perdoa as multas aos vips.
Pronto. Agora já ouviram o que não queriam e era perfeitamente escusado, já que nenhum agente será condenado por porra nenhuma (que nenhum juiz é doido e também anda na estrada de noite), e a coisa fica por isso mesmo. Não havia mesmo nenhuma necessidade de remexer no esgoto.
Agora cá está: um circo non-stop, um país que mais uma vez se revela, aos olhos internacionais, absolutamente subvertido - para não dizer invertido - que todos conhecemos bem demais, e por isso pasmamos com a falta de cuidado de quem se mete a fazer coisas institucionalmente inpensáveis no terceiro mundismo, como esta acusar a GNR das suas práticas diárias.
Já estava tudo explicadinho em qualquer episódio do Yes, Minister. Mas como a PJ só vê futebol...
Qualquer dia ainda algum Judite iluminado se vai lembrar de acusar algum padre de apalpar as fiéis na sacristia...

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